Céu de estrelas
Bom dia. Eu morava em Campo Grande e, havia o melhor “messenger” da época, o MIRC, na sala “Brasil”, aonde chegava a ter mais de mil pessoas na mesma sala, a gente conseguia pescar pessoas que depois leváva-mos para o MSN, ou o que fosse. Depois, com a democratização dos computadores e as experiências crescentes dos hackers, não dava mais para usar. Era muito pouco seguro e entupia qualquer computador de vírus. Não havia antivírus que desse jeito.
Mas eu fui um dos últimos heróis a usar o MIRC. Era tanta gente que dava para escolher gente de todos os tipos e de qualquer parte. A diferença é que você, ao chamar uma pessoa, abria um chat com a pessoa. E a coisa desenvolvia ou não. Era ótimo, mas foi um dos primeiros programas da internet e, desta forma, sem patrocínio, não dava para mantê-lo no ar. Eu é que sei ou que é pagar e trabalhar para fazer um site diário, quando não falha... Herrar é umano...
Daí achei uma “Lindinha” (ela se achava, né?), e puxei papo. Goiana, ajeitada, convidei para conhecer CG e ela foi. Foram 10 dias inesquecíveis e, quando ela foi embora eu senti um profundo vazio. Como eu só tinha compromisso comigo e minha mala, não tinha Chula nessa época, fui atrás da moça e, como eu sou muito prático, em 30 dias estava casado com ela. Só precisava ir a Campo Grande buscar o que desse pra levar embora. E abastecemos o “Golzinho” quadrado dela e partir pra estrada. Hahaha... E cadê a estrada?
De repente ela sumia, e quando você caía do outro lado estava com cárter do óleo furado, tudo certinho para fundir o motor. Num trecho de 80 quilômetros , entre a ida e a volta e mais uma vez que fomos, consegui fundir o motor três vezes. Na volta da última viagem, ao chegar na passarela do diabo, começou a chover. Mas era chuva de macho. Coisa bruta. Não dava pra ver nada. E fomos indo até que... atolamos. Bem à noite, numa estrada que os sabidos não trafegavam nem de dia, que dirá à noite.
Depois ela comprou um carrinho melhor, mas o de bunda quadrada nem som tinha. Ela vai ficar puta de eu ficar falando mal do carrinho dela que nos foi tão útil. Mas não tinha som mesmo. Bem... Um pobre outro coitado até quis ajudar. Mas era carro normal e, pra piorar, estava sem bateria, não conseguia mais dar partida e conseguimos fechar a estrada. E o tempo passava, a chuva não parava, e nem eu saía do atoleiro e nem o colega conseguia fazer o carro pegar. Foi escurecendo e ninguém aparecia para um socorro.
A paciência já tinha ido pro saco. Só dava um desespero de dormir sentado num carro abarrotado de coisas, três pessoas, e solução alguma. Foi aí que a chuva parou e, em pouco tempo, o céu limpou... Mas lua não seca barro. Daí eu, numa crise repentina de otimismo, observei que de uma hora para outra, mesmo estando nós no brejo puro, o céu estava limpo e lindo como raras vezes vi. Romântico que sou, depois de tanta desgraça, exclamei para a companheira que estava já parindo o filho que não esperava: “Olha, amooorrr, que céu mais lindo. Que coisa deslumbrante!!!”. Pensei que iria agradar.
Mas não foi o que aconteceu. Ela ficou foi triplamente mais nervosa. Estava para morrer com tanta desgraça e o otimista estava admirando a beleza do céu. Acho que ela nem olhou, mas ficou com raiva de mim por muito tempo. Será que em meio a tantos contratempos não poderíamos admirar a única coisa boa, embora não desatolasse carro e nem fizesse as horas passarem?
Empurramos o carro que não pegava para a lateral da estrada e logo em breve apareceu uma carreta, único monstro capaz de andar naquela estrada. Pelo avançado da hora, o rapaz foi até gentil em nos levar. Aquela região, sul de Goiás e norte de Mato Grosso do Sul, é uma terra de ninguém. Tanto que a primeira coisa que o motorista nos mostrou foi seu revólver para resolver problemas de tráfego. Andar de carreta já é uma desgraça. Naquela estrada não podia ser pior. Mas conseguimos, aos solavancos, chegar numa CIDADE decente que tinha socorro e pudesse ir buscar o carro para nós, e depois lavar, revisar para seguir viagem. Não foi fácil.
Mas, o que importa para mim, até mesmo para esquecer as longas horas de abandono naquele meio do fim do mundo, é que talvez tenha sido aquele o céu mais lindo que eu já vi na minha vida. Todas as estrelas compareceram. Pode ser que já tenha visto outro mais deslumbrante, mas não emporcalhado de barro dos pés à cabeça. E o frio? Todo molhado? Mas nada disso mudou o céu. Só a reclamação da companheira que queria que eu enfiasse o céu na sacola e jogasse no mato.
Já fazia tempo que eu não vivia uma aventura assim. Foi bom para rejuvenescer. Até amanhã.
Zé Caparica - 09.02.2010